sábado, 7 de julho de 2007

Paranauêêêê, Paranauêêêê, Paraná!

Nunca me interessei por capoeira. Poucos foram os momentos que “perdi” olhando grupos se apresentando em praças de outras cidades ou no calçadão de Resende, minha cidade, sempre dando os seus shows nas manhãs de sábados.

(É isso mesmo, ô meu! Aqui também temos calçadão e um shopping center. Tá pensando o quê?).

Tinha de acontecer de me interessar por esse esporte num vídeo que caiu na minha tarrafa e que foi realizado em Vancouver, no Canadá, lá na puta-que-pariu! Originada da África, existindo fortes referências de Angola, se constituía, originalmente, numa simples, porém terrível arte marcial, praticada pelos escravos para facilitar as suas fugas e sendo considerada como "coisa de vagabundo” pela sociedade, de modo geral. Eu a confundia como uma simples dança regional da Bahia. Em verdade, em verdade vos digo que são quatro vídeos que resumem nuns 40-50 minutos todos os seus fundamentos, passos, contra-ataques e golpes, tais como a rasteira, a meia-lua, e por aí vai.

Na mesma página de apresentação desse vídeo, embaixo e ao lado da telinha, existe a indicação de centenas de vídeos brasileiros e de várias partes do nosso moribundo planeta sobre capoeira. Resultado: passei umas quatro horas navegando por vários deles, principalmente nos brasileiros, cujos patrícios se mostram feras em exibições que ultrapassam os limites do fantástico. Linhás, nos vários vídeos estrangeiros existe uma unanimidade que não deixa de passar desapercebida: em todas as escolas dedicadas a essa arte, todos os mestres capoeiristas são brasileiros!

O vídeo que indiquei acima e os outros que dão continuidade ao mesmo mostram como acontecem defesas e ataques durante uma luta, mas, por serem pedagógicos, meio na câmera lenta, deixam de mostrar o que aconteceria numa luta real. E aí o bicho pega, tal a velocidade com que os respectivos movimentos são realizados e que podemos imaginar vendo os vídeos das apresentações de brasileiros.

A história dessa arte, transformada num esporte genuinamente brasileiro, baiano, nos moldes como está estruturado atualmente, se deve ao baiano, lógico, Manuel dos Reis Machado (1900-1974), conhecido como Mestre Bimba, praticante de capoeira desde os doze anos de idade.

Foi no ano de 1929 que ele resolveu desenvolver um estilo diferente da capoeira trazida pelos escravos oriundos de Angola, considerada por ele como lenta e ineficiente, hoje conhecida apenas como capoeira antiga, com suas tradições regionalizadas na ocasião no Rio, Bahia, Recife, São Luís, etc. Para isso, ele fez a junção do batuque com aquela arte marcial, introduzindo novos golpes, ao que acrescentou o berimbau como uma dos elementos indeléveis da capoeira, considerado mais como elemento excitador do lutador do que um marcador de compasso e que, diga-se de passagem, é, na atualidade, o símbolo maior da Bahia. Antes da sua inclusão na capoeira, nos idos da capoeiragem velha do Recôncavo, os sons que acompanhavam as exibições eram feitos pela viola e pelo pandeiro. Surge, então, a moderna capoeira regional que ano a ano vem sempre desenvolvendo mudanças mais eficientes como forma de arte marcial ou esporte.

Assim, Mestre Bimba sagra-se como o criador, o pai da moderna capoeira, hoje marca registrada do Brasil e conhecida nos quatro cantos do mundo. Antes de Mestre Bimba, a luta era ilegal, passível de punição pelo Código Penal, discriminada pela burguesia como coisa de malandro, de escravo fujão. Os capoeiristas sequer sonhavam em sobreviver dessa manifestação popular, o que só foi revertido 1932, depois que ele a registrou como Centro de Cultura Física Regional, localizada no Bairro do Pelourinho, em Salvador.

Mestre Bimba porém, não estava sozinho, pois, apesar de jamais ter tido um intelectual de porte capaz de dar crédito no mundo dos letrados, e este teria sido um dos fatores explicativos do preconceito que se formou contra ele e a capoeira, ele respirava o debate intelectual sobre a capoeira que emanava do Rio de Janeiro.

Bimba e sua Capoeira Regional representaram um dos grandes momentos de afirmação da nova identidade negra em construção no século 20, conjuntamente com as Escolas de Samba no Rio de Janeiro e a Frente Negra em São Paulo. Nada mais justo!

No final da vida, exilado por conta própria em Goiânia e esquecido por todos, caiu em depressão e morreu na miséria, enfartando depois de comandar sua última roda de capoeira. Desde 1978, seus restos mortais estão em Salvador, sua terra natal, depois de ter sido enterrado como indigente no Estado de Goiás. Deixou 13 filhos, centenas de alunos, milhares de discípulos e um lema: "Capoeira é a arte do bem-viver."

Em 12 de Junho de 1996, a Universidade Federal da Bahia concedeu, por unanimidade, o título de Doutor Honoris Causa a Manoel dos Reis Machado (Mestre Bimba).

Virei fã! Um pouco atrasado, mas suficiente para ir em algum próximo sábado apreciar no calçadão de Resende o show dos capoeiristas resendenses e quiçá, em face dos conhecimentos adquiridos, bater palmas ou meter o cacete! Verbalmente, numa boa, porque os golpes que eles desferem podem ser mortais!

O título que dei a este post é o refrão de uma música comumentemente cantada numa roda de capoeira e está inserida a partir de 05’:30” do início da apresentação do primeiro link deste post.

I tragam u birimbau pra genti cantá Paranauêêêê, paranauêêêê, Paraná i bebê cus músicus!

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